O temporal desabou furioso sobre a cidade. A chuvarada foi tão intensa que para logo inundou as ruas de vários bairros, enquanto trovões estrondavam surdos dentro da noite rasgada pelos relâmpagos atemorizantes. Como acontece nessas ocasiões, a energia elétrica faltou e as casas ficaram às escuras.
- Você vai ao Centro hoje, pai? – indagou a menina de sete anos.
O pai, senhor de meia-idade, alguns cabelos brancos, fisionomia um tanto cansada, freqüentava, como assistente, há anos, determinada Casa Espírita, dirigiu o olhar para a esposa, com quem jantava à luz de um tosco lampião, como que a pedir-lhe a melhor resposta também. E antes que ele mesmo à filha satisfizesse, a mulher tomou a palavra e explicou calmamente:
- Ora, meu anjo, é claro que o papai vai ao Centro hoje, sim. Acaso ele deixaria de ir ao trabalho pelo simples fato de cair uma chuva mais forte?
Animado com o apoio da esposa, levantou-se da mesa, preparou-se ligeiro e, despediu-se. Como era perto, seguiu a pé. Não desejaria ficar esperando por um ônibus que, decerto, custaria muito a passar. E na caminhada, protegido por uma capa plástica e um guarda-chuva, ficou a pensar de si para consigo: Puxa! Como sou teimoso! Bem que poderia ficar em casa e ir até dormir mais cedo. Amanhã será domingo e, caso a chuva cesse, irei a um piquenique com a minha família. Recolher-me ao leito mais cedo seria bom, tenho andado tão cansado ultimamente. Umas dores nas costas. Deve ser coisa da coluna. Ou da idade mesmo. Sei lá. Mas, não. Vou sim. Naturalmente irá pouca gente e a sessão vai acabar logo.
E foi, embora não deixasse de existir, lá no fundo do coração, o secreto desejo de ficar em casa, sob a alegação fácil do mau tempo.
Foi e, de fato, havia reduzidíssimo número de assistentes encarnados, o que em absoluto não se repetia do ponto de vista espiritual.
A Casa, iluminada à luz de lamparinas, estava literalmente cheia. Agasalhava elevado número de
entidades sofredoras que eram beneficiadas com o produto amoroso da sessão realizada por homens encarnados, que com o pensamento voltado para o Bem, representavam mensageiros de Jesus, dando a todos os seus eflúvios de revitalizante bem-estar.
Regressando ao seu lar, aquele homem adormeceu alegre.
O domingo surgiu, então, radiante. O Sol brilhava altaneiro, esparramando por todas as partes as suas bênçãos de claridade e vida. E aquele modesto servidor pôde fazer descontraído piquenique com a família num dos bosques pelos arredores da cidade, cuja atmosfera fora fartamente lavada pela chuva da noite anterior.
Mal sabia ele, no entanto, que há alguns dias, fazia-se acompanhar de um Espírito inferior que desejava prejudicá-lo seriamente. Iria fazer, por simples prazer, tudo para que ocorresse algum incidente desagradável durante o passeio programado pela família. Era ele daqueles espíritos zombeteiros e invejosos, que não se conformam com a felicidade e a alegria alheia.
Este Espírito sofredor foi socorrido e esclarecido naquela reunião, naquela noite de chuva, e afastado daquele freqüentador anônimo de um Centro Espírita. (“Contando Histórias”, Celso Martins e outros).
Já me aconteceu.
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